ARRANHA-CÉU "VERDE"?


03/10/2011
André Trigueiro*



Por mais arrojado que seja um projeto de construção sustentável, ele não pode ser avaliado sem os impactos inerentes à sua existência sobre o entorno.

Do alto do Empire State Building, no parapeito do 101º andar – onde os turistas não têm acesso – o dono do edifício mais alto de Nova Iorque (até que o World Trade Center One fique pronto, em 2013) conseguiu impressionar os meus sentidos pela belíssima vista lá de cima. Mas percebeu – talvez um pouco frustrado – que eu não havia me convencido ainda  de que uma caríssima e bem executada reforma (retrofit)  tenha sido suficiente para tornar uma edificação de 443 metros de altura “sustentável”.
Anthont Malkin investiu U$13 milhões para tornar o prédio que fez King Kong famoso internacionalmente (ou seria o contrário?) um exemplo de “greenbuilding”.  O principal foco foi a redução do consumo de energia elétrica em 40%, o que representa uma economia de U$4,5 milhões por ano na conta de luz. Para alcançar este objetivo, entre outras providências, ele mudou a configuração de todas as 6.514 janelas do arranha-céu para que absorvessem o máximo de luz solar (quanto mais luz natural menor a necessidade de acender luminárias) e refletissem ao mesmo tempo o máximo de calor (reduzindo o consumo de energia para a climatização dos ambientes).
É evidente que iniciativas do gênero são muito bem-vindas e todos os esforços na busca pela redução do desperdício e maior eficiência devem ter visibilidade e incentivo. Assim como merecem aplausos, por exemplo, as políticas públicas para estimular que mais gente use a ótima rede de transporte público sobre trilhos (trens e metrô), em vez do automóvel.
Mas o ponto crucial aqui é considerar os impactos inevitáveis dos arranha-céus na “cidade que não dorme”, é um dos principais destinos turísticos do mundo e ostenta uma das maiores pegadas ecológicas do planeta.
Se é verdade que a aglutinação de escritórios ou residências em um mesmo espaço verticalizado reduz a demanda por novas áreas, onde a pressão pelo uso do solo é enorme, há que se considerar a gigantesca demanda a partir de um mesmo ponto (o do arranha-céu) por água potável, rede de esgoto, energia, gás, redes de comunicação, coleta de lixo e recicláveis e, principalmente, os efeitos dessa intensa movimentação de pessoas (moradores e/ou funcionários) sobre a mobilidade urbana. Em resumo: por mais arrojado que seja um projeto de construção sustentável, ele não pode ser avaliado sem os impactos inerentes à sua existência sobre o entorno.
Nova Iorque registra uma das maiores concentrações de arranha-céus do mundo e a auto-imagem da cidade se confunde com esse “paliteiro” sortido que nos causa forte impressão.  Mas a sua contínua verticalização – sempre justificada pelo fato de a cidade estar incrustada em uma ilha e, portanto, espacialmente delimitada – pressagia grandes desafios para os administradores que tenham o real objetivo de  proporcionar melhor qualidade de vida aos moradores da “Grande Maçã” no século 21.


* Jornalista com Pós-graduação em Gestão Ambiental pela COPPE/UFRJ. É Professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC/RJ.


Publicado em 03/10/2011 em <http://www.mundosustentavel.com.br/2011/10/arranha-ceu-verde/>